[espacosaude-ma] Desabafo de um professor substituto que aderiu à greve
Carta Aberta aos Estudantes: Desabafo de um Professor Substituto
> que
> Aderiu à Greve
>
>
> Caros Alunos. Estou aderindo ao processo de greve que foi
> deflagrado
> em nossa instituição. Não poderia mais ficar de fora enquanto
> vários de
> nossos colegas se debatem por melhorias nas nossas condições de
> trabalho. Sei que muitos estudantes, mais preocupados com as
> questões
> imediatas da formatura, se posicionam contra o movimento.
> Entretanto, a
> preocupação deveria ser com a formação e não com a formatura. E
> formação
> pressupõe uma visão de longo alcance. Não somente o imediatismo das
> aulas,
> que não conseguem conter toda a riqueza que espelha a formação do
> ser
> humano. Este se forma muito mais na prática, na interação com o
> outro, no
> processo de se construir coletivamente, do que em uma simples e,
> algumas vezes, medíocre aula teórica, um monólogo onde um professor
> repete
> conceitos que nem mesmo ele consegue entender direito, em uma
> atividade
> individualista onde o outro não importa, sendo apenas um meio
> fornecedor
> de dados para o meu desejado emprego no Estado, através de um...
> concurso!
>
> Se formos imediatistas, vamos inevitavelmente nos preocupar com as
> aulas que estamos perdendo, com as provas e com os trabalhos. Vocês
> devem
> perceber que isto tudo é a superfície do processo de aprendizado,
> apenas
> a casca da noz da questão principal. O homem deve compreender a
> dimensão coletiva da vida, tendo paciência histórica para acumular
> forças para
> os grandes saltos qualitativos que a existência nos reserva e não
> para
> simples acúmulos quantitativos, que nada significam. O homem não é
> uma
> abstração inerente ao indivíduo isolado, mas o conjunto das
> relações
> sociais, e como tal deve sentir, agir e construir.
>
> A greve é um direito coletivo dos trabalhadores. Está garantida na
> nossa Constituição. Todos nós repetimos isto com insistência em
> nossas
> aulas legalistas. Mas quando ela é deflagrada, infelizmente, nem
> sempre
> conseguimos entender quem é o verdadeiro inimigo e acabamos
> culpabilizando
> os grevistas que são as vítimas do processo e não os seus algozes.
> O
> verdadeiro culpado de um processo de mediocrização da carreira do
> magistério de nível superior, o verdadeiro culpado pela insistente
> tentativa
> de privatização branca de nossas Universidades "públicas, gratuitas
> e de
> qualidade" acaba ficando esquecido de todos aqueles que se
> posicionam
> contrários à greve. E lá vamos nós, professores e funcionários ser
> acusados dos crimes que nossos fustigadores nos impuseram.
>
> A greve não é somente por reposição salarial e melhores condições
> de
> trabalho. Mas ainda que o fosse seria, por si só, absolutamente
> legítima.
> A greve é pela manutenção da Universidade pública e gratuita para
> "todos" os cidadãos brasileiros. Nossa juventude menos favorecida
> está sendo
> ganha para o tráfico de drogas e para a criminalidade. Vivemos uma
> situação de guerra de classes. Deveríamos lutar para ganha-la para
> a
> Universidade, garantindo os meios de acesso a ela, como por exemplo
> o
> transporte coletivo gratuito para estudantes. No entanto, se os tão
> decantados
> caminhos de uma política neoliberal que prega o desmonte do
> Estado-Nação continuarem sendo trilhados, não haverá mais qualquer
> Universidade
> por que lutar. Todos nós, em virtude dos baixos salários,
> acabaremos indo
> trabalhar em instituições privadas por necessidade vital.
>
> Setecentos e vinte reais. É isto que nós estamos, como professores
> substitutos "ganhando" no final do mês! E volto a repetir, apesar
> de muitos
> de vocês não acreditarem que isto ainda possa existir: por puro
> idealismo! Estamos coadjuvando na formação de profissionais que
> dentro de três
> ou quatro anos, no máximo, estarão confortavelmente percebendo uma
> faixa salarial de dez mil reais como agentes do Estado,
> magistrados,
> promotores e delegados. E nós, professores, ainda estaremos aqui...
> Pergunto:
> é justo que um estudante exija do professor tal autoflagelamento?
> Que o
> professor não se renda aos encantos de outras instituições
> (privadas)
> ou de outras atividades mais bem remuneradas? Aí está um dilema: os
>
> alunos querem bons professores em sala de aula. Mas os bons
> professores não
> resistem muito tempo a tal desprendimento. E acabam abandonando o
> barco
> que estão lutando por manter navegando. Aí os alunos reclamam que
> não
> tem professores de qualidade ministrando aulas preparadas. E no
> final
> das contas, o velho ditado popular do "se correr o bicho pega, se
> ficar o
> bicho come" acaba se concretizando e todos nós, professores,
> funcionários e estudantes acabamos perdendo, sendo engolidos pelo
> bicho papão que
> tem nome e se chama privatização. Porque não soubemos eleger o
> inimigo
> a ser combatido, um inimigo que, com certeza, não somos nós,
> professores, não são os funcionários nem sequer os estudantes. É
> preciso pensar
> nisso.
>
> Os professores substitutos são os mais culpabilizados neste
> processo.
> Basta dizer que seus salários são pagos com os mesmos fundos de
> despesas
> com os quais se pagam o papel higiênico de nossos sanitários e o
> material de limpeza. Os professores efetivos nos vêem como
> trabalhadores
> meramente provisórios, que passarão sem deixar muitas lembranças.
> Os alunos
> ficam enraivecidos quando vêem "mais um substituto" chegando. E
> olhando
> firme em nossos olhos, dedo em riste, nos sentenciam veementemente:
>
> "substituto não pode fazer greve"! Como se o tal dispositivo
> constitucional que garante a todos os trabalhadores aquele direito,
> comportasse
> exceção no nosso caso. Mas nós também somos trabalhadores e
> trabalhadores
> qualificadamente explorados por este sistema. Porque somos
> utilizados
> como massa de manobra pelo Estado para diminuir o quadro dos
> professores
> efetivos, dando mais um passo em direção à privatização. Nossa luta
> não
> pode ser simplesmente pelo "aumento salarial" para os professores
> substitutos, proposta aliás tentadora para o governo que poderia
> dobrar o
> nosso salário e começar a aumentar a percentagem do quadro dos
> professores deste tipo, mais baratos e apenas contratados
> temporariamente, sem
> direitos trabalhistas (não somos regidos pela CLT), nem sequer
> direitos
> estatutários. Nossa luta deve ser pelo reconhecimento de que uma
> Universidade verdadeira não deveria sequer ter colaboradores. Que
> todos nós
> deveríamos ser absorvidos pela instituição como professores
> efetivos,
> para que pudéssemos gozar das mesmas condições de trabalho de um
> professor
> com este status. Para que pudéssemos nos dedicar a isto
> integralmente,
> estudando e oportunizando a vocês, alunos, cada vez mais e melhores
>
> oportunidades de conhecimento.
>
> É este estado de coisas contra o qual nos revoltamos. É esta
> constante
> sublimação de nossas necessidades em prol de um ideal não
> correspondido. É esta constante exigência de assumirmos uma
> condição quase religiosa
> de abnegação, porque não quisemos escolher trabalhos mais
> estratégicos
> para o desenvolvimento do mercado, do capital financeiro nacional e
>
> internacional e nem sequer uma posição mais estratégica no aparelho
>
> repressivo do Estado que se ocupa de manter o establishment
> capitalista como
> está: os trabalhadores cada vez mais miserabilizados enquanto os
> gestores do capital cada vez mais ricos.
>
> Poucas semanas antes de assumir a função da qual me orgulho,
> professor
> substituto da Universidade Federal de Santa Catarina, recebi
> convite de
> duas instituições privadas para lecionar minha disciplina, com
> remuneração superior ao dobro do que hoje recebemos e optei,
> franciscanamente,
> pela pública, em detrimento da privada. Até quando continuaremos
> resistindo? Até quando vamos conseguir escapar desse redemoinho
> cuja descarga
> nos levará, inevitavelmente para os fundos mais recônditos da
> privada?
>
>
>
> Matheus Felipe de Castro
>
> Doutorando e Professor Substituto na UFSC
>
> Disciplina de Direito Processual Penal
>
> Centro de Ciências Jurídicas
> que
> Aderiu à Greve
>
>
> Caros Alunos. Estou aderindo ao processo de greve que foi
> deflagrado
> em nossa instituição. Não poderia mais ficar de fora enquanto
> vários de
> nossos colegas se debatem por melhorias nas nossas condições de
> trabalho. Sei que muitos estudantes, mais preocupados com as
> questões
> imediatas da formatura, se posicionam contra o movimento.
> Entretanto, a
> preocupação deveria ser com a formação e não com a formatura. E
> formação
> pressupõe uma visão de longo alcance. Não somente o imediatismo das
> aulas,
> que não conseguem conter toda a riqueza que espelha a formação do
> ser
> humano. Este se forma muito mais na prática, na interação com o
> outro, no
> processo de se construir coletivamente, do que em uma simples e,
> algumas vezes, medíocre aula teórica, um monólogo onde um professor
> repete
> conceitos que nem mesmo ele consegue entender direito, em uma
> atividade
> individualista onde o outro não importa, sendo apenas um meio
> fornecedor
> de dados para o meu desejado emprego no Estado, através de um...
> concurso!
>
> Se formos imediatistas, vamos inevitavelmente nos preocupar com as
> aulas que estamos perdendo, com as provas e com os trabalhos. Vocês
> devem
> perceber que isto tudo é a superfície do processo de aprendizado,
> apenas
> a casca da noz da questão principal. O homem deve compreender a
> dimensão coletiva da vida, tendo paciência histórica para acumular
> forças para
> os grandes saltos qualitativos que a existência nos reserva e não
> para
> simples acúmulos quantitativos, que nada significam. O homem não é
> uma
> abstração inerente ao indivíduo isolado, mas o conjunto das
> relações
> sociais, e como tal deve sentir, agir e construir.
>
> A greve é um direito coletivo dos trabalhadores. Está garantida na
> nossa Constituição. Todos nós repetimos isto com insistência em
> nossas
> aulas legalistas. Mas quando ela é deflagrada, infelizmente, nem
> sempre
> conseguimos entender quem é o verdadeiro inimigo e acabamos
> culpabilizando
> os grevistas que são as vítimas do processo e não os seus algozes.
> O
> verdadeiro culpado de um processo de mediocrização da carreira do
> magistério de nível superior, o verdadeiro culpado pela insistente
> tentativa
> de privatização branca de nossas Universidades "públicas, gratuitas
> e de
> qualidade" acaba ficando esquecido de todos aqueles que se
> posicionam
> contrários à greve. E lá vamos nós, professores e funcionários ser
> acusados dos crimes que nossos fustigadores nos impuseram.
>
> A greve não é somente por reposição salarial e melhores condições
> de
> trabalho. Mas ainda que o fosse seria, por si só, absolutamente
> legítima.
> A greve é pela manutenção da Universidade pública e gratuita para
> "todos" os cidadãos brasileiros. Nossa juventude menos favorecida
> está sendo
> ganha para o tráfico de drogas e para a criminalidade. Vivemos uma
> situação de guerra de classes. Deveríamos lutar para ganha-la para
> a
> Universidade, garantindo os meios de acesso a ela, como por exemplo
> o
> transporte coletivo gratuito para estudantes. No entanto, se os tão
> decantados
> caminhos de uma política neoliberal que prega o desmonte do
> Estado-Nação continuarem sendo trilhados, não haverá mais qualquer
> Universidade
> por que lutar. Todos nós, em virtude dos baixos salários,
> acabaremos indo
> trabalhar em instituições privadas por necessidade vital.
>
> Setecentos e vinte reais. É isto que nós estamos, como professores
> substitutos "ganhando" no final do mês! E volto a repetir, apesar
> de muitos
> de vocês não acreditarem que isto ainda possa existir: por puro
> idealismo! Estamos coadjuvando na formação de profissionais que
> dentro de três
> ou quatro anos, no máximo, estarão confortavelmente percebendo uma
> faixa salarial de dez mil reais como agentes do Estado,
> magistrados,
> promotores e delegados. E nós, professores, ainda estaremos aqui...
> Pergunto:
> é justo que um estudante exija do professor tal autoflagelamento?
> Que o
> professor não se renda aos encantos de outras instituições
> (privadas)
> ou de outras atividades mais bem remuneradas? Aí está um dilema: os
>
> alunos querem bons professores em sala de aula. Mas os bons
> professores não
> resistem muito tempo a tal desprendimento. E acabam abandonando o
> barco
> que estão lutando por manter navegando. Aí os alunos reclamam que
> não
> tem professores de qualidade ministrando aulas preparadas. E no
> final
> das contas, o velho ditado popular do "se correr o bicho pega, se
> ficar o
> bicho come" acaba se concretizando e todos nós, professores,
> funcionários e estudantes acabamos perdendo, sendo engolidos pelo
> bicho papão que
> tem nome e se chama privatização. Porque não soubemos eleger o
> inimigo
> a ser combatido, um inimigo que, com certeza, não somos nós,
> professores, não são os funcionários nem sequer os estudantes. É
> preciso pensar
> nisso.
>
> Os professores substitutos são os mais culpabilizados neste
> processo.
> Basta dizer que seus salários são pagos com os mesmos fundos de
> despesas
> com os quais se pagam o papel higiênico de nossos sanitários e o
> material de limpeza. Os professores efetivos nos vêem como
> trabalhadores
> meramente provisórios, que passarão sem deixar muitas lembranças.
> Os alunos
> ficam enraivecidos quando vêem "mais um substituto" chegando. E
> olhando
> firme em nossos olhos, dedo em riste, nos sentenciam veementemente:
>
> "substituto não pode fazer greve"! Como se o tal dispositivo
> constitucional que garante a todos os trabalhadores aquele direito,
> comportasse
> exceção no nosso caso. Mas nós também somos trabalhadores e
> trabalhadores
> qualificadamente explorados por este sistema. Porque somos
> utilizados
> como massa de manobra pelo Estado para diminuir o quadro dos
> professores
> efetivos, dando mais um passo em direção à privatização. Nossa luta
> não
> pode ser simplesmente pelo "aumento salarial" para os professores
> substitutos, proposta aliás tentadora para o governo que poderia
> dobrar o
> nosso salário e começar a aumentar a percentagem do quadro dos
> professores deste tipo, mais baratos e apenas contratados
> temporariamente, sem
> direitos trabalhistas (não somos regidos pela CLT), nem sequer
> direitos
> estatutários. Nossa luta deve ser pelo reconhecimento de que uma
> Universidade verdadeira não deveria sequer ter colaboradores. Que
> todos nós
> deveríamos ser absorvidos pela instituição como professores
> efetivos,
> para que pudéssemos gozar das mesmas condições de trabalho de um
> professor
> com este status. Para que pudéssemos nos dedicar a isto
> integralmente,
> estudando e oportunizando a vocês, alunos, cada vez mais e melhores
>
> oportunidades de conhecimento.
>
> É este estado de coisas contra o qual nos revoltamos. É esta
> constante
> sublimação de nossas necessidades em prol de um ideal não
> correspondido. É esta constante exigência de assumirmos uma
> condição quase religiosa
> de abnegação, porque não quisemos escolher trabalhos mais
> estratégicos
> para o desenvolvimento do mercado, do capital financeiro nacional e
>
> internacional e nem sequer uma posição mais estratégica no aparelho
>
> repressivo do Estado que se ocupa de manter o establishment
> capitalista como
> está: os trabalhadores cada vez mais miserabilizados enquanto os
> gestores do capital cada vez mais ricos.
>
> Poucas semanas antes de assumir a função da qual me orgulho,
> professor
> substituto da Universidade Federal de Santa Catarina, recebi
> convite de
> duas instituições privadas para lecionar minha disciplina, com
> remuneração superior ao dobro do que hoje recebemos e optei,
> franciscanamente,
> pela pública, em detrimento da privada. Até quando continuaremos
> resistindo? Até quando vamos conseguir escapar desse redemoinho
> cuja descarga
> nos levará, inevitavelmente para os fundos mais recônditos da
> privada?
>
>
>
> Matheus Felipe de Castro
>
> Doutorando e Professor Substituto na UFSC
>
> Disciplina de Direito Processual Penal
>
> Centro de Ciências Jurídicas
"OU OS ESTUDANTES SE IDENTIFICAM COM O DESTINO DE SEU POVO, COM ELE SOFRENDO A MESMA LUTA, OU SE DISSOCIAM DELE, E NESTE CASO SERÃO ALIADOS DAQUELES QUE EXPLORAM O POVO"
FLORESTAN FERNANDES
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